segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Robin Williams e o Estranho Mundo de Garp

O falecimento de Robin Williams foi particularmente doloroso para os amantes do cinema um pouco por todo o mundo, não só pela perda de um talento com uma carreira invejável que ainda tinha muito para oferecer, mas especialmente pelas circunstâncias da sua morte. Um pouco por todo o lado multiplicaram-se as manifestações de dor e choque relativamente a um artista que ficará para sempre associado à comédia e boa-disposição.
Na semana passada, estava na cavaqueira com alguns colegas de trabalho precisamente a falar sobre este assunto quando um deles menciona que de futuro provavelmente nunca  conseguiria voltar a ver alguns filmes dele com o mesmo espírito. Que de alguma forma, as circunstâncias da sua morte lançariam sempre uma sombra sempre que ele visionasse determinados filmes dele. Disse-lhe que estava a exagerar. Que sim, que enquanto a notícia estava fresca na nossa mente, seria possível que isso ensombrasse a experência de rever um filme dele, mas que com o tempo isso se desvaneceria. E portanto, embora o impulso para o fazer fosse grande, abstive-me também eu de rever qualquer filme dele...até ontem.
Após consultar a lista de filmes que tinha com ele (um generoso total de 12), acabei por me decidir por um filme que já não revia desde os anos 80. Eram tempos mais simples em que os videoclubes começavam a surgir ainda de forma 'underground' e não perfeitamente legais, em que cada cassete VHS que traziamos para casa era uma incógnita pois também não existia IMDb, e a palavra gigabyte era um termo quase alienígena que dificilmente sugeria uma associação ao pagamento de um imposto. Lá me pus à procura dele nas estantes de dvds. Ainda demorei cerca de 15-20 minutos à procura porque estava na secção de dvds ainda por visionar, o que significa que não estava ordenado de nenhuma forma. Mas encontrei-o, ainda envolto em plástico e com a etiqueta de preço a indicar 7.99€




The World According to Garp é um filme que não se enquadra exactamente no género que concederia ao actor o reconhecimento universal, mas que encaixa perfeitamente no estado de espírito na base da decisão de rever um filme dele. Primeiro, porque foi a minha introdução ao Robin Williams, o primeiro filme que vi com ele como protagonista. Segundo, porque se depois decidisse escrever ou recomendar no blogue algum filme dele, porque não um que fosse relativamente mal conhecido. De facto, ninguém do meu círculo de amizades alguma vez o viu. E terceiro, porque é um filme perfeito para celebrar a vida do actor, pois trata ele próprio da celebração da vida. O filme baseado num romance de John Irving tem tudo - amor, ódio, traição, perdão, família, violência, humor, tragédia, sexo e morte. Como a mãe de Garp lhe diz no filme, todas as pessoas morrem. O importante é vivermos a vida antes de morrermos. Acho que Robin Williams o conseguiu.

Argumento: O filme é uma crónica da vida de T.S. Garp (Robin Williams), desde a sua concepção em circunstâncias muito pouco ortodoxas, infância e adolescência sob a alçada da sua mãe solteira (Glenn Close) enfermeira de profissão, até à maioridade como escritor de renome e extremoso pai de família, mantendo-se no entanto sempre na sombra do sucesso mediático da sua mãe que entretanto se torna uma figura de culto socio-político de movimentos feministas.

Confesso que estava um pouco receoso de que o filme não tivesse resistido bem ao tempo. Já não o via há imenso tempo, mas os meus receios viram-se infundados. Voltou a ser um prazer enorme visionar esta obra. O Robin Williams está bem, num papel que embora muito sólido não faria talvez adivinhar o percurso posterior do actor. A Mary Beth Hurt que desempenha o papel da esposa parece não ter tido a mesma sorte, sendo este talvez o ponto alto da sua carreira. O filme conseguiu duas nomeações para os oscares - A Glenn Close para actriz secundária logo na sua primeira longa metragem, e John Lithgow para actor secundário no papel de ex-jogador de futebol profissional transsexual.
O filme não teve muito sucesso, quer crítico quer comercial, mas na minha opinião vale bem a pena ver. É um filme inesquecível, principalmente pelo argumento, uma boa adaptação do romance original.

Recomendação:


Curiosidades: O autor do romance John Irving tem um pequeno papel no filme como árbitro durante o torneio de luta livre. Este foi o antepenúltimo filme de George Roy Hill, conhecido por filmes como Butch Cassidy and the Sundance Kid e The Sting. Viria ainda a realizar o relevante The Little Drummer Girl antes de se retirar da realização e dedicar-se ao ensino. Morreu em 2002 devido a complicações da Doença de Parkinson, a mesma que estará na origem do suicídio de Robin Williams.

Para acabar, não posso deixar de mencionar que apesar de ter tido um enorme prazer em rever este filme, e de ter conseguido durante o seu visionamento abstrair-me da morte recente do actor, dei por mim tocado por uma onda de tristeza completamente inesperada, quando durante os créditos finais toca a música dos Beatles 'When I'm Sixty-Four'. Robin Williams tinha 63.

1951 - 2014




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