Quando estreou no ano passado, esta série cuja acção decorre num planeta Terra profundamente transformado em 2047, a recuperar de uma guerra brutal entre a humanidade e um conjunto de espécies extraterrestres refugiadas, não podia deixar de me chamar a atenção. Aliás, essa é a minha resposta automática a qualquer série de um género que sempre se viu um pouco estigmatizado, e pelo qual sempre tive um fraquinho, quer na forma de cinema e tv, quer na forma de literatura. Se depois a qualidade justifica um acompanhamento regular já é outra história, mas no caso de Defiance até foi esse o caso. Apesar da primeira temporada não ter sido brilhante, dei por mim a segui-la todas as semanas.
A premissa geral, de uma cidade - Defiance, antiga St. Louis - que tenta recuperar e prosperar a partir das suas ruínas e da convivência e tolerância entre facções e espécies, com um histórico recente de violência e desconfiança, já para não falar de diferenças culturais óbvias, era suficientemente interessante. A isso juntava-se um ou dois enredos mistério a apimentar a história e agarrar o espectador, e que se foram desenvolvendo de forma satisfatória ao longo da temporada, para além de valores de produção e visuais apurados, e um conjunto de actores sólidos (alguns como Julie Benz, Jaime Murray, Graham Greene e Mia Kirshner caras bem conhecidas de outros trabalhos em tv e cinema), a desempenhar personagens que foram pouco a pouco ganhando vida à medida que decorria a temporada, a qual tem um final forte e que prometia uma segunda temporada excitante com uma alteração profunda do status quo.
Estamos agora a 3/4 na segunda temporada e começo a ter sérias dúvidas quanto à renovação para uma terceira. Não só a Syfy tem uma péssima reputação no que respeita a apoiar a continuidade das suas séries, como neste caso nem seria surpreendente face à fraca temporada a que tenho assistido. Continuo a seguir religiosamente os seus episódios, por uma razão que indicarei mais abaixo, mas o facto que é que vários dos seus elementos têm-se mostrado decepcionantes. Senão vejamos:
1. A alteração do regime governante. Defiance é efectivamente uma cidade ocupada por uma potência externa, mas tirando os primeiros dois ou tês episódios da temporada, praticamente não se nota a diferença no dia a dia da cidade e impacto nas histórias, se exceptuarmos a simples presença física dos novos personagens. A ocupação é visível e tem algum impacto negativo individualmente sobre algumas personagens, mas num todo, não se sente a ocupação de forma fundamental. Essencialmente o final da primeira temporada criou uma expectativa que nunca se concretizou.
2. Espécies Votan. Das 7 espécies extraterrestres que colonizaram o planeta, apenas 2 ou 3 viram-se minimamente desenvolvidas na primeira temporada, nomeadamente os Irathients, os Castithans e os Indogenes, isto porque apenas estas 3 espécies têm personagens de algum relevo na série. Esta situação mantêm-se mais ou menos inalterada nesta temporada, o que juntamente com outros factores representa um enorme potencial que não está a ser explorado e que chega a ser frustante.
3. O enredo secundário à volta de Irisa e do seu papel profético, que tão excitante e promissor parecia na primeira temporada, tornou-se fonte de aborrecimento. Mais exasperante que ver um elemento tornar-se perfeitamente desinteressante, é ter que gramar uma percentagem considerável do tempo dos episódios dedicado ao mesmo.
4. Personagens. Um dos pontos altos. Personagens que foram crescendo e evoluindo ao longo da temporada anterior. Defiance era inclusivamente uma série que tinha um número invulgar de personagens femininas fortes, superiores em número e poder aos seus pares masculinos. Na sua esmagadora maioria viram-se regredir nesta temporada.
- Nolan. Personagem estagnado. Não tem tido a relevância esperada apesar de ser cabeça de cartaz da série. Um ou outro bom momento representam muito pouco em comparação com a anterior temporada.
- Irisa. A Irathian rebelde regrediu para uma sombra do que era, agora que parece ter deixado de ter personalidade própria como resultado da submissão a uma entidade ou dispositivo de natureza dúbia.
- Amanda. Ex-presidente da câmara e a mulher mais importante de Defiance tornou-se agora a gerente do bordel anteriormente da irmã, ocasionalmente conselheira aos ocupantes da cidade, e toxicodependente de uma droga extraterrestre nos tempos livres.
- Rafe. O anterior motor da prosperidade e um dos pratos na balança de poderes da cidade, viu-se usurpado das minas que controlava e tornou-se uma personagem irrelevante. Que desperdício.
- Kenya. Ausente.
- Yewll. A médica e cientista da cidade, detentora de uma língua mais afiada que os seus bisturis, e de um passado tenebroso, vê-se nesta nova temporada relegada a essencialmente papel de parede, sendo utilizada somente quando argumentistas necessitam de alguém com aptidões científicas. O único desenvolvimento que viu foi a revelação inconsequente da sua orientação sexual.
- Tommy. ex-interesse romântico de Irisa, é agora apenas um personagem que me irrita profundamente sempre que aparece.
- Niles. Nova personagem. O novo governante da cidade. Zero carisma. Péssima escolha de actor e fraca contribuição para a série no seu todo. Era preferível terem escolhido William Atherton, que desempenha o seu superior hierárquico, para o papel.
- Berlin. Nova personagem. Não é má de todo, mas irrelevante. Quando não aparece esqueço-me completamente que ela existe.
- Os Tarr. O único grupo de personagens que cresceu ou manteve a sua relevância na série. Datak manteve o seu peso relativo. Apesar de as coisas serem agora bastante diferentes, a sua personagem continua a ser interessante de seguir, não fosse ela estar tão intimamente ligada à principal força positiva da segunda temporada. O mesmo se pode afirmar relativamente a Alak e Christie Tarr, que apesar de se manterem ainda personagens menores, tiveram mesmo assim uma evolução positiva. E claro a principal razão, senão mesmo a única, pela qual ainda sigo esta série - Stahma Tarr, protagonizada pela estonteante Jaime Murray.
Se Stahma era já uma personagem fascinante na primeira temporada, nesta é uma autêntica força da natureza, continuando a emanar charme e sensualidade, que associada à sua inteligência, capacidade manipulativa e implacabilidade, a tornam numa das mais formidáveis personagens femininas da televisão. Semana após semana, encontro-me agarrado ao ecrã da tv para beber daquele sorriso desarmante que por trás de pretensa humildade e submissão esconde uma mente a planear mil maneiras de lixar a vida a quem quer que se atravesse no seu caminho.
O peso relativo da Stahma na minha apreciação global da temporada é tão grande, que se a removêssemos dos episódios, já teria deixado de a acompanhar há algum tempo atrás. Será que a série consegue sobreviver apenas à custa de uma só personagem? Tenho sérias dúvidas. Penso que a decepção tem sido generalizada considerando os valores de audiência que têm vindo a decair regularmente. Se aliarmos a isto os custos de produção que não são baratos (foi a série mais cara de sempre da Syfy, com um investimento de 100 milhões de dólares distribuídos também pela produção do videojogo com o mesmo nome), não me surpreenderia verificar o seu cancelamento no final desta temporada. Ou talvez o investimento já feito seja a salvação da série. Vamos a ver.
Continuo a pensar que Defiance tem um enorme potencial de histórias por contar, mas tem que se apressar em concretizá-lo e inverter o marasmo actual. Urgentemente.
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